Disparado, o que mais me perguntam a respeito da França é o tamanho do quadro da Monalisa. Depois, me perguntam se é verdade que os franceses são mal educados, que tratam mal os clientes, que só querem falar francês e mais um monte de outras coisas sem propósito que o amigo do amigo contou. Para as duas perguntas, eu respondo que tudo é uma questão de expectativa.
Eles realmente são mais fechados, mais diretos e menos simpáticos que nós. É cultural, não adianta. Não podemos esperar que todos sejam iguais, e se você quer ir para algum lugar onde as pessoas ajam iguais às daqui, por que sair daqui então?
Paris está entre as cidades mais visitadas do mundo. Cerca de 30 milhões de turistas passam por lá todo ano. Número muito maior que a cidade do Rio de Janeiro, por exemplo. Isso significa muitos turistas andando pelas ruas, frequentando restaurantes, transporte público, hospitais, muitas pessoas perdidas, precisando de informação, muitas culturas diferentes, muita gente passeando, no meio de um monte de gente indo para a escola, trabalhando e seguindo a sua rotina normal de cada dia.
Os turistas (ou pelo menos a maioria) são os mais óbvios possíveis. Mesmo quando a cidade oferece inúmeras atrações, eles acabam indo aos mesmos lugares, aos mesmos museus, aos mesmos restaurantes.
Não me levem a mal, eu sei que seria impossível, surreal e inadmissível até ir para Paris e não visitar a torre Eiffel. Mas, pense comigo, será que o restaurante na esquina da torre, que recebe inúmeras pessoas por dia, que provavelmente não voltarão nunca mais, vai se preocupar em proporcionar a melhor experiência para os seus clientes, em ter o preço mais acessível e o produto mais fresco?
Será que o francês que sai do trabalho e, por infelicidade do destino, tem que passar na frente da torre na volta pra casa vai ter paciência para te mostrar onde fica o metrô? Quando trinta segundos antes foi parado por um grupo de mais de ou menos 100 chineses, falando alto, com duas câmeras fotográficas cada um, tirando foto das pombas, da folha, da árvore, da formiga e da gravata borboleta cor de rosa que ele está usando combinando com a meia (moda comum nas ruas da França).
Quanto à língua, essa ideia de que todo o mundo tem que falar inglês ou ter paciência para entender as suas mimicas é coisa de brasileiro, me desculpe. Nos EUA, se eu chegar falando em português, ninguém vai me entender, e se eu fizer mimicas é capaz de responder “Ah! Samba, Rio, Carnaval, topless”.
A questão é a seguinte: o país não é seu, você está indo visitar, com o objetivo de conhecer outra cultura, ver coisas diferentes, conhecer um mundo diferente do seu. Que tal perder algumas horas das doze que você vai ficar no avião tentando aprender como se fala: “por favor”, “obrigada”, “dá licença”, “sim”, ”não”, “bom dia”, “boa tarde”, “boa noite”. Não custaria nada e mostraria que você respeita a cultura local, a história do país, a língua e principalmente as suas diferenças.
Uma vez escutei um francês dizendo que o problema não era o inglês, que ele falava e entendia perfeitamente. O problema era que as pessoas assumiam que ele falava inglês e vinham falar com ele diretamente em inglês, sem ao menos perguntar se ele falava ou não.
Eu sei, eu sei. Aqui no Brasil, os turistas fazem isso, vejo gringos na praia esperando que o tio do coco fale inglês, e a gente se desdobra pra entendê-los. Agora pense bem, os franceses estão realmente errados em esperar que as pessoas se esforcem para no país deles falarem a língua deles?
Eu passei seis meses em Paris sem falar francês. Eu juro que nunca fui mal tratada depois de um: “Bonjour, je ne parle pas français. Parlez-vous l’anglais ?” (Bom dia. Eu não falo francês. Você fala inglês?). Mesmo quando não falavam, o gelo já tinha sido quebrado, eles notavam o meu esforço e sempre pacientemente me ajudavam.
A respeito dos restaurantes, vou contar uma historinha, que para bom entendedor será suficiente.
Estávamos, eu e meu esposo, em um restaurante pequeno em Montmartre, onde morávamos. Era um restaurante de comida francesa, com um chefe, um cozinheiro e um garçom. Tipo de restaurante que eu gosto, pequeno, comida boa, preço justo, tradicional e onde os moradores do bairro frequentam.
Fomos muito bem tratados logo na entrada. O menu ficava em um lousa, pois ele variava de acordo com a disponibilidade de ingredientes daquele dia. Outro fato que amo, pois sei que vou comer tudo fresquinho.
Chegam duas turistas, entram no restaurante já falando em inglês: “Table for two, please.” O garçom educadamente responde em inglês para elas escolherem a mesa, recolhe os casacos e pergunta se elas preferem o menu em inglês. Elas dizem que sim. Ele traz uma outra lousa, agora com tudo escrito em inglês, puxa uma cadeira ao lado delas e deixa a lousa lá para elas escolherem. Ele serve pão e a água, e aguarda elas chamarem para o pedido, fica próximo, mas não lado da mesa, respeitando a privacidade das duas.
Depois de alguns minutos, elas chamam o garçom dizem que querem o boef borguignon mas, que em vez de batata assada querem frita e que o molho da carne deveria ser sem cogumelos. O garçom educadamente diz que aquele prato é tradicional e que naquele restaurante eles não alteram o menu, que o chefe havia planejado todos os pratos com muito cuidado e que elas poderiam escolher outra opção já que o menu era bem variado. Elas argumentam um pouco, não aceitam o posicionamento do garçom e se levantam. O garçom tranquilamente devolve os casacos, deseja uma boa noite e abre a porta da saída. Elas vão embora reclamando do restaurante e dos franceses.
Agora, imagine um turista chegando em um restaurante aqui pedindo uma feijoada com peito de frango e que em vez de feijão deveria ser grão de bico. O que será que nosso garçom faria?
Ah, a propósito, para responder a primeira pergunta, a Monalisa nem é tão pequena.
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